A OUTRA FACE

               


AO GOSTO DOS ANJOS VII

                 
    


Sempre penso em Leopoldina como a terra adotada por meus avós ao chegarem da Síria - tios, tias, primos/primas, tanta gente...! E, aliada a essa imagem de gente destemida e desbravadora, penso em Leopoldina com duas referências "nobres": uma é Augusto dos Anjos ( e sua poesia impressionante que descobri ainda jovem, lendo o solitário "EU") ; a outra figura marcante e profunda é Miguel Torga.                       

Leopoldina os terá certamente escolhido por algum misterioso motivo que não poderemos nunca desvendar. E penso que viram ambos o mesmo traçado urbano, ouviram sons semelhantes, encontraram as pessoas semelhantes na rua, sentiram a paisagem circundante em prováveis e confluentes graus de apreciação; perceberam ambos o sofrimento de muita gente e se sentiram sem munições para aliviá-lo.

 Torga recolheu a amargura da vida severa, na fazenda do tio; formaram-se ali certamente o poeta e o contista.

 Augusto dos Anjos sai de minha memória adolescente sob meu sentimento agudo de certa pena, que a poesia de EU me revelava, o aterramento de homem sem alegria, de espectro que passava pela vida como por sacrifício, atado à herança inevitável de ser humano, preso à ancestralidade trágica de ter nascido sem ter sido consultado... Pesada atmosfera de sofrimento. O sofrimento por todos os lados... 

Mas a página de Elias Abrahim faz virar essa página de memória e impressões, ao trazer um outro Augusto, de carne e osso, real, histórico, morador em Leopoldina - na rua Cotegipe onde morou a prima Mariana Alice Neder, de tão bela memória, capacitada na cultura renascentista tão acessível que conversava comigo, ainda garota, falando da pintura de Rafael Sanzio... Bem, esse Augusto, que o primo Elias desvenda e apresenta em sua bela página de análise poética e biografia, desfaz muito da atmosfera dolorida com que minha lembrança o evoca.


Que figura leve e suave a desse diretor-poeta! Que trato humano e sensível! Claramente sensível ao sofrimento do outro a que respondia fraterno e solidário, mostrando não apenas o diretor humano, o professor, mas também e quem sabe já, na prática da vivência em Leopoldina, exercitando o fingimento estético no tempo presente que aí viveu, seguindo Fernando Pessoa e cumprindo, assim, o ideal de humanidade aliado ao do ato de fingir, e fingir tão completamente mostrando, na poesia, a face triste e abatida que na vida ocultava!


Obrigada, Elias, por esse desvendamento que você oferece ao leitor!

Francelina Silami Ibrahim/ Editora Liberdade

Comentário sobre a outra face de Augusto dos Anjos, tema retratado em

FASCÍNIO PELO CÓSMICO FATÍDICO DE ALGUNS ANJOS.

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