UM PERSONAGEM POUCO CONHECIDO- JÚLIO FERREIRA CABOCLO

UM PERSONAGEM POUCO CONHECIDO

Nilza Cantoni[1]

JÚLIO FERREIRA CABOCLO nasceu em 1901 em Manaus, filho de José Liberato Ferreira Caboclo e Maria Eliza Ferreira. Foi jornalista, professor, poeta e cronista. Em 1922 veio para o Rio de Janeiro em busca de trabalho. Foi contratado pelo Colégio Ítalo-Brasileiro, de Santo Antônio de Pádua (RJ), ali ficando poucos meses e se transferindo para Leopoldina, onde passou a lecionar no então Ginásio Leopoldinense. Pouco depois, passou também a dar aulas particulares e a trabalhar no Colégio Sagrado Coração de Jesus.

        Em 23 junho 1925, no Ginásio, foi um dos fundadores e presidente do Grêmio Litero-Artístico Augusto dos Anjos, entidade que tinha por objetivo cultuar a obra do poeta do EU.

        Em Leopoldina Caboclo conheceu Esther Fialho, viúva de Augusto dos Anjos e com ela se casou em 16 de agosto de 1923. Para ela publicou poemas de amor, em francês e em português, na Gazeta de Leopoldina. 

        Ao se casar com Júlio, Esther tinha um casal de filhos do seu casamento com Augusto dos Anjos: Glória e Guilherme Augusto. Com Júlio teve as filhas Selma e Elida, nascidas em Leopoldina e Maria Elisa, nascida e falecida com 15 dias de vida, em 1831, em São João Nepomuceno.  A menina morreu quatro dias depois da morte da mãe, Esther Fialho.


        Viúvo, com duas filhas menores e dois enteados do primeiro casamento de Esther, Júlio casou-se segunda vez com Lygia de Macedo Cerqueira em 1933. Logo depois foi contratado pelo Colégio Modelo, em Nova Friburgo (RJ), onde nasceram duas filhas: Guaynubi e Apalaís. Mais tarde a família voltou para São João onde nasceu o caçula: Júlio César.
          
        Entre o nascimento dos dois últimos filhos a família viveu um período sombrio. Vigorava a Constituição de 1937, a Polaca, que implantou o Estado Novo. As atividades políticas de Júlio Ferreira Caboclo o levaram a ser preso e a se afastar da família.

        Em 1943 voltou para o Rio de Janeiro como professor do Colégio Santa Teresa, em Olaria. A família permaneceu em São João por mais algum tempo. Na década de 1950, era Chefe de Arquivo de O Jornal e Diretor de uma Biblioteca na Avenida Rio Branco, no centro do Rio de Janeiro. Faleceu no Rio de Janeiro aos três dias de julho de 1969.

        Segundo Miguel Torga, o poeta português que estudou no Ginásio no início dos anos vinte, um artigo de seu professor Júlio Caboclo “falava da liberdade de pensamento, do respeito pela dignidade humana, acusava os tiranos de assassinos da consciência, e acabava por concluir que o Brasil era um feudo de meia dúzia de capangueiros”. Discurso que ainda hoje identifica políticos da oposição.

          

     Sua militância política acontecia também através da poesia, com poema epigrafado por Plínio Salgado, fundador da Ação Integralista Brasileira. E Júlio foi um homem gentil, homenageando uma das primeiras feministas brasileiras com artigo e poema.
         
        Sem dúvida alguma, Caboclo foi um grande divulgador e incentivador do culto à obra de Augusto dos Anjos, seja em sala de aula ou escrevendo matérias para jornais e revistas. Publicou-as em periódicos de Minas e do Rio, especialmente nos meses de novembro de cada ano, em homenagem ao falecimento do poeta. Enquanto viveu em Leopoldina, através do Grêmio promoveu romarias ao túmulo e a chamada Missa de Arte, na qual falavam vários oradores.
        
        Romântico ou amargurado, Júlio Ferreira Caboclo declarou inúmeras vezes o quanto o poeta do Eu o impressionou. E ele mesmo impressionou não só os alunos em quem estimulou o culto da obra de Augusto dos Anjos como a nós, que quase cem anos depois nos debruçamos sobre os textos que escreveu e nos sentimos como Miguel Torga tão bem expressou: “Embora de carne e osso, parecia-nos mitológico”.


*Nota do editor: Resumo de palestra sobre o professor amazonense Júlio Ferreira Caboclo, que foi um grande  divulgador do culto a memória do Poeta do “ EU”, proferida  por Nilza Cantoni, especialista em história cultural e membro da Academia Leopoldinense de Letras e Artes, por ocasião das recentes comemorações do centenário de morte de Augusto dos Anjos. O texto acima embora, não se refira a década de 1980, insere-se na proposta de resgate dentro  da linha editorial do Almanack, com grande apelo neste sentido.




*Texto publicado no Almanaque Arrebol REMEMÓRIA 80 - Dezembro/2014

 

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