REMEMÓRIA DE UMA DÉCADA
Tudo começou há pouco mais de 30 anos, com
a foto da velha locomotiva a vapor. Era
a efervescente década de1980 de transformações políticas, eleições diretas,
constituinte, euforia do fim de um regime autoritário, a ditadura militar, e de
grande fertilidade cultural. Então surgiu a ideia de editar o Almanaque de
Leopoldina, fruto de idealismo e superação material ,com a proposta de resgate
da memória,com entrevistas, curiosidades,poesias,
fotos, crônicas, artigos,desenhos...,que desfilaram em nossas páginas com a colaboração de pesquisadores,
artistas, poetas, escritores e”anônimos”,muitos dos quais já não estão entre nós, e com fundamental apoio de parceiros anunciantes.
Procurávamos registrar eventos e datas significativas e, às vezes, na pressa, ocorriam falhas (seleção de textos, fotos,
fotos, crônicas, artigos,desenhos...,que desfilaram em nossas páginas com a colaboração de pesquisadores,
artistas, poetas, escritores e”anônimos”,muitos dos quais já não estão entre nós, e com fundamental apoio de parceiros anunciantes.
Procurávamos registrar eventos e datas significativas e, às vezes, na pressa, ocorriam falhas (seleção de textos, fotos,
Nessa década fértil, vários periódicos
surgiram. Entre um Almanaque e outro , também editamos especias comemorativos,
como o Cavalo Abaíba,Carnaval, 50 anos da Exposição Agropecuária ( que na
época representava bem a característica da cidade nos setores da pecuária e
agricultura).
Nas ruas, observava-se a poda criteriosa dos oitis, que chegavam
a tocar uns com os outros. As seis palmeiras imperiais(foto de 1983), plantadas
na praça central, segundo a tradição oral, pelo Imperador D. Pedro II por
ocasião de sua visita à cidade já quase no fim da monarquia, quando um grupo de
Republicanos se recusou a recebê-lo na Câmara, seriam cortadas pouco depois. Hoje, a praça está
agonizante, com o corte de suas frondosas árvores; o coreto já não é mais o
mesmo; o parque central já não tem identidade; os orelhões,antes usados com
fichas de metal e seus atuais cartões, praticamente inexiste.
Há que se destacar a gastronomia. Comia-se uma deliciosa carne dos pampas na UAI
Gaúcha; massas e comida francesa no
restaurante dos italianos; pizzas e churrasco, no Clube Leopoldina; traíra sem espinha, no botequim da Getúlio Vargas; no Clube Brasília, mandioca com torresmo. Os picolés eram de frutas naturais, e as alvoradas de carnaval terminavam
no Rangão (trailer móvel) da praça.Tínhamos, e ainda temos, doces famosos, como os que foram servidos no casamento da filha do Ibrahim Sued, os doces de Manga servidos no Casamento do Príncipe Charles com Lady Diana,e as balas de coco “Me leva Brasil”.
Entre tantas outras referências: a capela do Colégio Imaculada, prédio antigo, que exibia pinturas sacras de Funchal, foi demolida; o Cine Brasil exibia pornochanchadas e Kung-Fu; na tevê, a madrugada era com Ferreira Neto; o bloco Zé Pereira do Mestre Vitalino com sua baiana gigante e bois malucos amedrontavam as crianças; as folias de reis do Bastião Medeiros (Alto do Cemitério) e a do Bastião Macena (Serra dos Barbosas), as mais antigas da região; o poeta compunha suas canções também no Morro do Cruzeiro; o jovem escritor pesquisava raízes ancestrais; o artista rasgava o metal e o linóleo com seu buril; o pintor, num surto de genialidade, alugou o chalé onde morou o poeta Augusto dos Anjos, ministrando aulas de desenho e pintura , dando vida ao Espaço dos Anjos; o grupo de dança,em seus primeiros passos, realçando o folclore; o teatro, com textos de Ed Zampier, era apoiado pelo Flávio; o pioneirismo dos primeiros times feminino de futebol da cidade, o Dinamic’s do Zé Carlos, o Tulís da D. Iris.
Nessas andanças, testemunhamos alguns fatos que significam perda da nossa memória: certa vez, dona Julinha, viúva do Rolly, idosa, colocou no lixo um caixote desses de feira, repleto de negativos em chapa de vidro; de outra vez, na Biblioteca Municipal local, deparamos com a partitura do “Hino à Caridade”, composto pelo Maestro Tavares em parceria com Augusto dos Anjos, mas, em outro momento, ao procurá-la não mais encontramos; as crônicas que o Prof. Hudson escrevia para a Z YK-5, se perderam na enchente de 1980 juntamente com grande parte de seu arquivo fotográfico. Recentemente, em contato com familiares de D. Ione Berzins,esposa do Arvedo, procuramos o ensaio original sobre discos voadores e outros peças do acervo desse fotógrafo e para nossa surpresa tivemos a informação de que, em uma faxina rotineira, se desfizeram de tudo; assim como alguns pertences do espólio dos Anjos, guardados em caixas por um longo período, foram devorados por ratos e traças.
Em algumas fotos, observamos a corrosão do tempo sobre os negativos, alterando e interagindo com a imagem, como na foto do Mausoléu de Augusto dos Anjos. Nesse túmulo, ao lado, foi plantado um pé de Tamarindo trazido da Paraíba, o qual posteriormente foi carbonizado por uma descarga elétrica .
Hoje, atendendo ao convite da Casa de Leitura Lya Botelho, realizamos esta retrospectiva. Parafraseando Carlos Drummond de Andrade, em uma referência a Leopoldina, sobre uma entrevista de Moacyr Carneiro à Gazeta em 11/1979, “Todos nós nos enganamos um pouco, sem malícia, e o tempo se encarrega de misturar as coisas”.
ELIAS ABRAHIM NETO
NOVEMBRO/2014
*Texto do Folder que serviu como capa do Almanaque Arrebol - REMEMÓRIA 80 - Dezembro/2014
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